O esporte nasceu para ser o território da superação, da disciplina e do valor. Um campo sagrado onde vence quem se prepara melhor, e não quem manipula melhor. Mas há tempos o esporte deixou de ser somente jogo — virou negócio, espetáculo, mercado e, uma vez que agora se descobre de novo, um terreno fértil para todo tipo de esperteza.

Nos Estados Unidos, o FBI acaba de furar a caixa-preta da NBA. Um técnico lendário, Chauncey Billups, e jogadores em atividade foram presos sob denúncia de envolvimento com uma rede de apostas ilegais ligada à máfia italiana. As investigações apontam fraude, lavagem de numerário, roubo — o cardápio completo da delinquência moderna. O basquete, que se vendia ao mundo uma vez que exemplo de profissionalismo, agora precisa se explicar uma vez que qualquer outro setor contaminado pela ganância.

Zero disso é exatamente novo. O numerário fácil das apostas e dos “investidores” de ocasião há muito ronda o esporte mundial. O que muda é a sofisticação: o jogo sujo agora se infiltra pelo algoritmo, pela planilha de estatísticas, pela aposta ao vivo. Quem antes corrompia árbitros, hoje manipula probabilidades.

No Brasil, o enredo não é tão dissemelhante. O futebol, paixão que se confunde com identidade vernáculo, vive sob o mesmo risco. Casos de manipulação de resultados, apostas suspeitas e empresários com fichas policiais viraram rotina. E quando surgem notícias de que o delito organizado tenta fincar bandeira em clubes de volume, é impossível não sentir um horripilação — o mesmo que agora percorre os ginásios da NBA.

O esporte, esse último refúgio da inocência coletiva, está sendo testado. A depravação deixou de ser um meandro e virou segmento do manual de gestão. Jogadores viram marionetes, técnicos tornam-se cúmplices e dirigentes se transformam em corretores de influência. Tudo isso em nome de uma termo que parece mágica, mas quase sempre maldita: lucro.

Enquanto torcedores continuam acreditando no milagre do gol, do ponto ou da cesta, há quem aposte — literalmente — que o resultado pode ser comprado. Talvez o maior drama do nosso tempo seja nascente: a trapaça ganhou status de estratégia, e o talento, de ingênuo.

O FBI pode prender mafiosos, as corregedorias podem alongar dirigentes, mas o que está em jogo é mais profundo: a psique do esporte. E essa, se continuar à venda, logo não valerá mais nem o preço de uma aposta.